terça-feira, 16 de fevereiro de 2010

A trilogia de um Carnaval: Ato 2 - Arlequim

     Do pulmão saiu uma fumaça cinza e logo em seguida uma tosse seca. Arlequim repousou o cigarro com aroma de canela no cinzeiro, que na verdade era uma lata de cerveja vazia. A mão esquerda segurava mais um retalho vermelho, que em breve a mão direita, com sua agulha e linha dourada, terminaria de fazer uma calça de losangos. Afinal de contas era carnaval.
     Lembrou-se dos carnavais anteriores. Dos dias em que participou de blocos de sujo com amigos que agora estão morando do outro lado do oceano. Lembrou-se do último ano. Dos olhos castanhos e da pele morena. Da cintura fina, das ancas largas. Dos seios firmes e da boca vermelha. Lembrou-se de Colombina, a garota que trabalhava de atendente em uma pizzaria da cidade.
     E sua calça estava pronta. Branca, vermelha e preta com as costuras aparentes em dourado. Por cima uma camiseta branca de mangas longas. Colocou uma máscara que deixava aparente apenas a boca. Seus lábios carnudos com dentes brancos e perfeitamente alinhados. O sorriso sarcástico estava ali. Pegou o telefone e discou.
     - Pizzaria da Cidade... boa noite!
     - Boa noite! Eu desejo uma pizza inteira de amor, com bordas recheadas de paixão. Para acompanhar quero Colombina. - Uma risada abafada surgiu no outro lado da linha.
     - Arle... quantas vezes já falei para não ligar para cá? E hoje vou sair com Pi...
     - Mas você sabe que o valor de Pi não é exato. Exato é o que sinto por você. Que tal um baile à dois em um motel da cidade, realizando nossas fantasias?
     - Eu tenho o teu número. Quando eu sair daqui eu te ligo.
     - Certo. Fico esperando!
     Mas Arlequim não era de esperar. Desceu as escadarias do pequeno prédio de aluguéis e foi andando pelas ruas da cidade. Ia fumando e cantando as pequenas marchinhas de carnaval. Foi costurando as ruas. Mexia com alguns foliões. As nuvens no céu não deixava a lua aparecer. Ou seria lua nova?
     Arlequim caminhava nas horas e se sem perceber se perdeu nelas. Quando chegou a pizzaria, as portas estavam fechadas. Mas como bom vivente que era, sabia que a uma quadra dali morava Colombina. E ele estava preparado.
     Quando chegou na porta da casa dela, tirou um canivete da calça e junto um coração de tecido. E na porta da casa de Colombina o jovem de calças de losango deixou o seu coração. Quando amanhecesse Colombina iria se tornar Arlequim.
      Mas quando é que o dia amanhece?

Nenhum comentário:

Postar um comentário